Samuel me enviou a mensagem abaixo, a qual me pareceu preocupante a ponto de compartilhar com outros colegas.
Uma decisão judicial justiça estabelecendo que o orientador não pode ser co-autor do trabalho científico com o orientando não pode passar sem uma manifestação da comunidade científica. Na verdade qualifica a prática como usurpação.
A justiça dar parecer em autoria de trabalho científico já é algo, para mim, inusitado. Deve haver precendente, mas em casos específicos e quando envolve aspectos de propriedade intelectual. Uma decisão deste tipo, tera ampla repercussão sobre as relações orientador-orientando.
“Prezados amigos, estou lhes transmitindo abaixo um e-mail que recebi de um colega da UFPR. Eu me lembro de ter visto esta noticia na Gazeta do Povo de Curitiba mas não levei a sério. Todavia é sério e acho que temos que estar alertas e que a comunidade científica tem que se manifestar, talvez no seu maior foro que é a ABC. Abraços, Samuel”
“No último dia 15 de novembro foi publicada matéria na Gazeta do Povo relatando que o Prof. Miguel Noseda, de nosso Departamento, juntamente com a UFPR foram condenados por usurpação de autoria de trabalho científico. O prof. Miguel e a universidade deverão recorrer da sentença. Entretanto, apontamos a preocupação com o teor da sentença que afeta a todos os orientadores deste Setor e deste país que trabalham com pesquisa científica, experimental e financiada, em todos os níveis de orientação, da forma que conhecemos.
Salientamos que pontos descritos na sentença estabelecem que oorientador não é co-autor do trabalho desenvolvido, levantando aspectos importantes envolvendo a propriedade intelectual da instituição, os financiamentos obtidos pelo orientador para realização da pesquisa, as publicações/patentes decorrentes da pesquisa, etc.
Consideramos importantíssimo que esses pontos sejam discutidos neste Setor e nesta universidade, pois acreditamos que a sentença emitida afeta a todos os orientadores/pesquisadores e, neste aspecto, ratificamos que o Prof. Miguel tem nosso apoio incondicional. Abaixo, colocamos alguns pontos para localização e entendimento do problema e posterior discussão
Abraços a todos
Leda Chubatsu e Fany Reicher
Depto. de Bioquímica e Biologia Molecular
1. Em março de 1997, Gladys A. H. Majczak ingressou como estudante de mestrado junto ao Programa de Pós-Graduação em Ciências-Bioquímica da UFPR sob orientação do Prof. Miguel Noseda e defendeu a dissertação de mestrado em agosto de 1999. No período de 03/97 a 02/99 recebeu bolsa CAPES-Demanda Social.
2. Em maio de 1999, durante a XXVIII Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Bioquímica e Biologia Molecular (SBBq) e Caxambu-MG, foi apresentado um resumo e poster contendo resultados obtidos durante o desenvolvimento da dissertação de mestrado. Neste resumo, a ordem dos autores foi: Majczak, Duarte e Noseda.
3. Em 2001, o trabalho foi novamente apresentado, na forma de resumo e pôster, durante o XVII International Seaweed Symposium realizado na África do Sul. Neste resumo a ordem dos autores foi: Noseda, Majczak e Duarte, sendo apresentado pelo prof. Noseda que participou o evento. Este trabalho recebeu a premiação “Japan Seaweed Association Poster Awards”, durante o simpósio, valor de US$ 500,00. Este trabalho foi publicado posteriormente numa forma expandida no livro “Proceedings of the 17th International Seawee Symposium” e a ordem dos autores foi Majczak, Richartz, Duarte e Noseda.
O processo judicial foi iniciado por Gladys Majczak acusando o Prof. Noseda de “usurpação de autoria de trabalho científico” referindo-se ao resumo apresentado e premiado durante o Simpósio na África do Sul. A defesa do Prof. Miguel baseou-se na co-autoria do trabalho. A sentença caso foi emitida em 03 de novembro (de acordo com a Gazeta do Povo)
Para atribuição da sentença, a juíza cita os artigos 11 e 15 da Lei no. 9.610/98 sobre co-autoria :
*Art. 11. *Autor é a pessoa física criadora de obra literária, artística ou científica
*Parágrafo único. *A proteção concedida ao autor poderá aplicar-se às pessoas jurídicas nos casos previstos nesta Lei.
*Art. 15. A co-autoria da obra é atribuída àqueles em cujo nome, pseudônimo ou sinal convencional for utilizada. *
*§ 1º *Não se considera co-autor quem simplesmente auxiliou o autor na produção da obra literária, artística ou científica, revendo-a, atualizando-a, bem como fiscalizando ou dirigindo sua edição ou apresentação por qualquer meio.
*§ 2º *Ao co-autor, cuja contribuição possa ser utilizada separadamente, são asseguradas todas as faculdades inerentes à sua criação como obra individual, vedada, porém, a utilização que possa acarretar prejuízo à exploração da obra comum.
Abaixo estão transcritas parte do texto da sentença
(...) Desse modo, as monografias, dissertações ou teses têm uma característica dialogal, de conjunção de dois fluxos intelectuais, sendo um o autor e outro o orientador (coadjuvante), que apenas aconselha, orienta e o dirige. A função do orientador é trazer à tona novas idéias, achados, ensinamentos que o fluxo criativo do orientado produzirá. O orientador não escreve, não redige o conteúdo e a substância do trabalho. Se agisse dessa maneira, estaria violando as regras do programa de pós-graduação /stricto sensu/.
(....)
Embora seja importante a contribuição do Professor Miguel para a obtenção dos prêmios no Simpósio Africano, porquanto foi ele quem viabilizou sua apresentação, isso não tem têm o condão de conferir-lhe a condição de co-autor. Quando muito, poderia ser nominado colaborador. A produção científica estava completa, ocupando-se o Professor, no propósito de apresentar o trabalho, da adoção de procedimentos meramente burocráticos (elaboração de resumo, inscrição e apresentação). A prova produzida evidencia que a autora foi quem pesquisou, redigiu, elaborou e completou a produção científica.
(...)
No caso /sub judice/, diante dos elementos de convicção constantes nos autos, considero que os fatos aqui abordados são gravíssimos, uma vez que o réu Miguel Daniel Noseda agiu de má-fé, enviando um trabalho de autoria de GLADIS para um Simpósio na África do Sul, se intitulando co-autor, juntamente com outra professora...
(...)
*III. DISPOSITIVO*
Diante do exposto, julgo procedente o pedido para declarar a autoria exclusiva de Gladis Anne Horacek Majczak do trabalho apresentado no XVII Congresso Internacional de Algas Marinhas, na África do Sul, intitulado "Atividade Anti-herpética da Heterofucana Sulfatada Isolada de Sargassum Stenophyyllum", e condeno o réu Miguel Daniel Noseda a: a) proceder à retificação do nome do autor no trabalho junto à comissão do evento (...)”