quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Quer emagrecer? Durma mais, porém com a luz apagada


ResearchBlogging.org
Há várias indicações de como perder peso. Comer pouco é, seguramente, a mais acertada. Porém, o que é comer pouco? Quase todos os obesos afirmam comer pouco. Além da quantidade, há a questão da composição da alimentação. São muitas e variadas as dietas que levam à perda de peso. Contudo, o desfecho parece preocupantemente homogêneo: todas as dietas promovem redução de peso, mas a perda é transitória. Após um lapso variável de tempo, os quilos estão de volta. Ou seja, não dá para encarar a dieta como passageira, precisaria haver uma mudança sustentada e definitiva de quantidade e composição da sua alimentação. Isto é muito mais simples de dizer (ou escrever) que de fazer.
Uma notícia interessante, em aspecto que já se conhece há algum tempo, vem de um trabalho do centro médico da Universidade de Chicago (aqui): a perda de peso depende das horas de sono. A princípio, o fato de perder peso durante o sono pode parecer paradoxal. Ninguém pratica exercício dormindo… Pense, de outra maneira, também não se come durante o sono. O que realmente ocorre?
Já havia sido demonstrado que homens jovens e sadios com sono de apenas 4 horas por duas noites apresentam queda dos níveis de leptina, um hormônio relacionado com a saciedade, e aumento de grelina, hormônio que dispara a fome (Ann Intern Med 141:846-850, 2004). Contudo, um experimento de duração tão curta não assegura que tais alterações permanecem caso ocorra a privação de sono por um período prolongado. Poderia ocorrer um reequilíbrio do sistema. Adicionalmente, também não se pode assegurar que estas alterações hormonais levem a modificações capazes de se manifestar no equilíbrio energético e variação de peso.
No dia 5 deste mês, o mesmo grupo publicou um artigo no qual testa por períodos mais longos a privação do sono e analisa em relação ao peso (Ann Intern Med 53: 435-441, 2010).  A nova publicação incluiu mulheres e homens (com sobrepeso e não fumantes) e relata um estudo randomizado com dois períodos e duas condições com cross-over. Os voluntários foram submetidos a uma restrição calórica moderada e durante um período dormiam 8 horas e meia, enquanto no outro período dormia 5 horas e meia. Durante os dois períodos, a atividade física e dieta foram similares nos dois grupos. Os voluntários viveram, este período, num ambiente de hospital, para que fosse possível assegurar a similaridade da dieta e fossem aferidos com precisão as suas atividades físicas e horas de sono.
À primeira vista, o resultado foi desapontador: a perda de peso foi similar e não afetada pelo tempo de sono. Porém a diferença foi importante no tipo de perda de peso. Durante o tempo adequado de sono, metade da redução de peso ocorreu às custas de perda de gordura. Durante o período de privação do sono, somente um quarto da perda de peso se deveu à perda de gordura, havendo perda de massa muscular. 
Results: Sleep curtailment decreased the proportion of weight lost as fat by 55% (1.4 vs. 0.6 kg with 8.5 vs. 5.5 hours of sleep opportunity, respectively; P = 0.043) and increased the loss of fat-free body mass by 60% (1.5 vs. 2.4 kg; P = 0.002). This was accompanied by markers of enhanced neuroendocrine adaptation to caloric restriction, increased hunger, and a shift in relative substrate utilization toward oxidation of less fat.”
Assim, parece que o sono contribui para a manutenção de massa corporal sem gordura, pelo menos durante períodos de restrição de energia. 
Durante a restrição de sono, houve, também neste estudo, aumento dos níveis de grelina e foi observada uma redução da taxa metabólica em repouso.  Para manter períodos de vigília maiores, há uma alteração de uso na fonte de energia. 
Ou seja, não é só porque o indivíduo acordado por um período maior tem mais tempo de visitar a geladeira, há, verdadeiramente, uma vantagem do sono para manter o metabolismo adequado. 
Tudo parece se confirmar. Lembram do post Cochilar é bom: Preguiça baseada em evidências científicas ?
Pouco depois, dia 11 deste mês, um outro estudo foi publicado sobre a influência da luz à noite sobre a massa muscular (PNAS, on line antes de impresso, DOI 10.1073/pnas.1008734107). Observe que este segundo estudo foi realizado em camundongos e seus resultados podem não ser diretamente extrapoláveis para o homem. 
A homeostase energética tem uma regulação circadiana e o nosso relógio biológico depende da luz. O nosso relógio biológico se localiza no hipotálamo e é sincronizado por informações obtidas por células sensíveis à luz localizadas na retina e transmitidas ao sistema nervoso central. Há estudos que demonstram que camundongos com mutações no seu relógio biológico são susceptíveis à obesidade. O nosso equilíbrio energético depende da iluminação, contudo a pergunta prática é: a exposição à luz durante a noite se relaciona com obesidade?
Os camundongos expostos a luz, mesmo que luz fraca, durante a noite apresentaram aumento de massa corporal e redução de tolerância à glucose em relação aos animais no ritmo normal de claro/escuro, embora todos tivessem a mesma ingesta calórica e nível de atividade.
These results suggest that low levels of light at night disrupt the timing of food intake and other metabolic signals, leading to excess weight gain. These data are relevant to the coincidence between increasing use of light at night and obesity in humans.
Considere os dois artigos em conjunto e analise os nossos hábitos atuais. Se dorme menos, pois há muito estímulo para atividades noturnas, em casa ou fora dela. Paralelamente, há uma maior oferta de energia elétrica o que leva a maior luminosidade noturna. Estes dois aspectos, podem contribuir (embora, evidentemente, não sejam únicos) para a epidemia de obesidade na sociedade moderna.
Assim, lembre que dormir bem e no escuro faz parte de uma dieta saudável. Ao contrário da maioria das recomendações para emagrecer, estas são duas medidas fáceis de adotar….
Ilustração: Morfeu e Iris, de Guerin (1811)

Spiegel K, Tasali E, Penev P, & Van Cauter E (2004). Brief communication: Sleep curtailment in healthy young men is associated with decreased leptin levels, elevated ghrelin levels, and increased hunger and appetite. Annals of internal medicine, 141 (11), 846-50 PMID: 15583226

Nedeltcheva AV, Kilkus JM, Imperial J, Schoeller DA, & Penev PD (2010). Insufficient sleep undermines dietary efforts to reduce adiposity. Annals of internal medicine, 153 (7), 435-41 PMID: 20921542

Fonken, L., Workman, J., Walton, J., Weil, Z., Morris, J., Haim, A., & Nelson, R. (2010). Light at night increases body mass by shifting the time of food intake Proceedings of the National Academy of Sciences DOI: 10.1073/pnas.1008734107

3 comentários:

  1. É bom que você sempre traz noticias animadoras sobre perda de peso e vida saudável, como beber vinho, comer chocolate e agora dormir! A vida não poderia ser melhor!!!

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  2. Devo admitir que há algum viés.... Pelo menos vamos interpretar que a ciência também dá boas notícias sobre a saúde.

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  3. São duas medidas que também melhoram qualidade de vida. Vc falou que pode haver algum viés. É possível, pois observe que o resultado do objetivo primário (peso) foi negativo. Aí os autores partiram para objetivos secundários na tentativa de mostram algo de positivo. Dados de objetivos secundários apenas geram hipótese.

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