Post de Natalia Tavares
O fim
dos meus 3 meses de doutorado sanduíche estão se aproximando e tive uma
excelente oportunidade de descobrir que tipo de ciência é feita aqui no IPMC
(Institut de Pharmacologie Moléculaire et Cellulaire – Valbonne,
Sophia-Antipolis) com o “Retraite Scientifique” antes de retornar ao Brasil.
Basicamente, todo o instituto se reúne num congresso onde seus estudos são
apresentados de forma oral ou em pôster. Tudo se assemelha muito a um “meeting”
oficial, com avaliação dos trabalhos e premiação.
A primeira coisa
que me chamou atenção foi a quantidade de laboratórios envolvidos em estudos
neurológicos. Desde evolução do cérebro humano até neuropatias, como autismo,
epilepsia, depressão e Alzheimer, passando por interações entre sistema nervoso
e imune. Nesta última área, está inserido meu orientador daqui, Nicolas
Glaichenhaus (aqui):
Acredito que os
cânceres eram o segundo tema mais comum, porém alguns poucos se aventuravam na
biologia da divisão celular, reciclagem de receptor e doenças renais. Sim, é um
instituto com temas diversos, mas praticamente nenhum com estudos em humanos.
Em quase todas as apresentações apareciam os “knockouts”, quimeras e linhagens
possíveis.
Uma das
primeiras apresentações que se aproximam de uma das áreas de estudos do
LIMI-LIP, leishmaniose, envolvia cicatrização. Roger Rezzonico, pesquisador do
grupo de Pascal Barbry, estuda o perfil e função de microRNAs na cicatrização
da pele. Eles observaram um acúmulo de miR-483-3p em culturas de queratinócitos
humanos danificados por arranhão e também em camundongos com feridas
excisionais, na fase final de fechamento da lesão. A expressão de miR-483-3p
impede a proliferação de queratinócitos danificados e seu bloqueio mantém a progressão do ciclo
celular, com atraso na expressão de marcadores de diferenciação. Em modelo
murino de câncer de pele, o grupo detectou 47 miRNAs com expressão alterada
durante a carcinogênese. Focando em clusters significativamente reduzidos, eles
mostraram que apenas 3 (miR-193b, miR-365a e miR-708) inibiam crescimento
celular, migração e sobrevivência de células tumorais, reforçando sua função
potencial como supressor tumoral.
No
segundo dia, a primeira palestra sobre como o cérebro e o sistema imune se regulam
foi ministrada por Nicolas Glaichenhaus. Sua introdução relembra que as
respostas imunes são reguladas por microorganismos, morte celular, mas também
por sinais dos sistemas nervoso e endócrino. Por outro lado, o sistema imune
produz citocinas que regulam a função do sistema nervoso central (SNC), que tem
efeitos no comportamento. Estes sinais compõem um circuito regulador que une
fisiologia com condições sociais e ambientais, percebidos pelo SNC e com papel
na “tomada de decisão” pelos leucócitos. Esta regulação do sistema imune
mediada pelo CNS otimiza o “fitness” total do organismo e aponta novas
oportunidades terapêuticas no controle de doenças infecciosas, inflamatórias e
neuropsiquiátricas. Ele cita, então, um estudo muito interessante de Cao e
colaboradores (DOI 10.1016/j.cell.2010.05.029), onde os camundongos são mantidos em 2 tipos diferentes de gaiolas
(Fig. 1):
·
Ambiente padrão: composto por
maravalha, água e ração (SE).
·
Ambiente enriquecido: com
estímulos sensoriais, cognitivos, motores e sociais (EE – Fig. 1 A).
Após 3 ou 6
semanas, células de linhagem de melanoma (B16F10) foram implantadas por via
subcutânea no flanco dos camundongos. 2 semanas depois, foi observada redução
significativa no volume do tumor em camundongos provenientes do EE (Fig. 1 B).
Além disso, a taxa de crescimento do tumor ao longo do tempo e a presença de
tumor sólido visível foram reduzidas nos animais do EE.
Esta resistência
ao tumor nos animais EE estava associada com alterações no eixo endócrino e
resposta imune aumentada. As vias envolvidas servem como componentes de uma
rede reguladora maior que influencia a resposta do hospedeiro. Não é provável
que apenas uma única variável seja responsável por todos os efeitos do EE, mas
é plausível que alterações no cérebro tenham um papel central em vias
periféricas como efetores secundários.
Mas, como
relacionar isso com o ambiente em que nós, humanos, vivemos e qual sua
influência no sistema imune? E como estas vias podem ser alvos terapêuticos
eficientes contra doenças infecciosas em circunstâncias tão complexas? É
importante ressaltar que são descritos tipos diferentes de estresse: o
“eustrese,” ou o que seria estresse positivo e o “distresse”, ou estresse
negativo, associado a ambientes adversos/hostis. Este último já relacionado à
disfunção de órgãos e supressão do sistema imune (McEwen et al., 2007).
Referências:
Cao, Liu, Lin,
Wang, Choi, Riban, Lin and During; 2010. Environmental and genetic activation
of a brain-adipocyte BDNF/Leptin axis causes câncer remission and inhibition.
Cell 142, 52-64.
McEwen; 2007.
Physiology and neurobiology of stress and adaptation: central role of the
brain. Physiol. Rev. 87, 873-904.
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