Post de Bruno Sangiorgi
A despeito do aquecimento global ser um assunto polêmico, e para muitos ainda controverso, cabe à ciência estar a par das possíveis consequências advindas deste fenômeno. Tendo como pressuposta a sua ocorrência, será inevitável a elevação do nível dos mares decorrente do derretimento das calotas polares. Ao final do século 21, espera-se que haja uma elevação do nível do mar em até 60cm, levando tanto ao recuo da zona costeira quanto à invasão da água marinha em em rios e lagos de água doce, aumentando no interior do continente a quantidade de águas salinas e salobras, respectivamente.
Dentre os muitos problemas decorrentes deste cenário, foi recentemente estudado seu possível impacto na dinâmica dos vetores de doenças infecciosas. Especial atenção foi dada aos insetos que realizam oviposição em água, pois a redução na quantidade de águas doces, associada a profusão de águas salinas e salobras, poderá influenciar na disponibilidade dos locais para oviposição e na sobrevivência das formas imaturas (ovo, larva e pupa). Estas alterações deverão implicar em flutuações na densidade vetorial, influenciando na redução ou expansão das doenças transmitidas.
Umas das hipóteses apresentadas pelos pesquisadores prevê o aumento na densidade de insetos vetores tolerantes à salinidade, bem como novos locais de ocorrência destes vetores. Baseado no fato que muitas espécies vetoras, principalmente dos gêneros Aedes, Anopheles e Culex, apresentam mecanismos fisiológicos e estruturais que permitem a tolerância a salinidade de formas imaturas, é plausível que o acréscimo na quantidade de águas disponíveis para oviposição seja acompanhado pela expansão numérica das populações e colonização de novas áreas alagadas. Esta suposição é corroborada pela expansão populacional de vetores do gênero Anopheles, seguido por surtos de malária, na região costeira da Ásia após o tsunami de 2004, fato que reproduz o que se entende por invasão marítima.
A nível global, a elevação do nível do mar associada ao aquecimento das zonas temperadas tornará estas regiões mais permissivas a sobrevivência dos insetos vetores. Isto poderá implicar na migração de populações dos vetores para o norte e sul do planeta, afetando uma parcela significativa da população mundial, pois mais da metade dela se localiza a pelo menos 60km das regiões costeiras atuais. Deste modo, extrapolando a hipótese apresentada, o surgimento generalizado de novos focos das doenças tropicais negligenciadas ao redor do globo poderá, no futuro, torná-las menos tropicais e negligenciadas.
Refêrencias:
Manguin, S., Garros, C., Dusfour, I., Harbach, R., & Coosemans, M. (2008). Bionomics, taxonomy, and distribution of the major malaria vector taxa of Anopheles subgenus Cellia in Southeast Asia: An updated review Infection, Genetics and Evolution, 8 (4), 489-503 DOI: 10.1016/j.meegid.2007.11.004
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