segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

O papel da pesquisa no setor público na descoberta de fármacos e vacinas

Stevens e colaboradores publicaram neste último 10 de fevereiro no New England Journal of Medicine um artigo muito interessante sobre o papel do financiamento público no desenvolvimento de novos fármacos e vacinas [1]. A visão do senso comum, corroborada por alguns artigos citados pelos autores [2-6], é a de que nas universidades e instituições de pesquisa públicas existe uma concentração da pesquisa em temas básicos, gerando conhecimentos que são posteriormente utilizados pelo setor privado para criar novos fármacos e vacinas dentro da lógica de geração e exploração de novas patentes.

Os autores basearam-se, entre outros, em registros do Food and Drug Administration (FDA) [7], órgão dos estados Unidos da América responsável pela regulação de diversas substâncias para uso em humanos antes da sua comercialização no país [8]. Eles chamam a atenção para o fato de que a mudança na legislação relativa à propriedade, gerenciamento e transferência de propriedade intelectual criada no âmbito das instituições de pesquisa do setor público (PSRIs) nos anos 80 permitiu que as universidades e centros de pesquisa financiados com dinheiro público tivessem melhor participação na propriedade e gerenciamento de invenções acadêmicas, o que se refletiu em um aumento importante na contribuição destas instituições para o desenvolvimento de novas patentes biomédicas.

Os autores destacam que o maior número de contribuições das PSRIs no desenvolvimento de novas patentes ocorreu exatamente nas áreas onde o orçamento investido correspondeu a uma parcela maior: a oncologia e as doenças infecciosas. Eles chamam a atenção ainda para o elevado número de vacinas (15 no total) desenvolvidas com a participação de PSRIs: segundo os mesmos, “virtualmente todas as vacinas importantes, inovadoras que foram introduzidas durante os últimos 25 anos foram criadas por PSRIs”. Outro importante achado é o de que, apesar das PSRIs serem responsáveis por pouco menos de 10% de aplicações de novas drogas para patentes, quase metade das drogas propostas foram consideradas com prioridade alta de revisão pelo FDA por apresentarem também potencial ganho substancial de eficácia em comparação com produtos já no mercado para o tratamento, diagnóstico ou prevenção da doença correspondente.

O artigo é extremamente animador!, ao mostrar o quanto uma legislação focada para favorecer a pesquisa e o desenvolvimento, aliada ao fomento focado nas questões de saúde pública de interesse nacional e às boas parcerias público-privadas podem realmente contribuir para ciência de boa qualidade, revertendo-se em benefício para a população e para a humanidade.


[1]A.J. Stevens, J.J. Jensen, K. Wyller, P.C. Kilgore, S. Chatterjee, M.L. Rohrbaugh, The role of public-sector research in the discovery of drugs and vaccines, N. Engl. J. Med. 364 (2011) 535-541.

[2]B. Zycher, J.A. DiMasi, C. Milne, Private sector contributions to pharmaceutical science: thirty-five summary case histories, Am J Ther. 17 (2010) 101-120.

[3]J.A. DiMasi, R.W. Hansen, H.G. Grabowski, The price of innovation: new estimates of drug development costs, J Health Econ. 22 (2003) 151-185.

[4]K.I. Kaitin, N.R. Bryant, L. Lasagna, The role of the research-based pharmaceutical industry in medical progress in the United States, J Clin Pharmacol. 33 (1993) 412-417.

[5]B.N. Sampat, Academic patents and access to medicines in developing countries, Am J Public Health. 99 (2009) 9-17.

[6]R. Kneller, The importance of new companies for drug discovery: origins of a decade of new drugs, Nat Rev Drug Discov. 9 (2010) 867-882.

[7]Orange Book: Approved Drug Products with Therapeutic Equivalence Evaluations, ([s.d.]).

[8]Food and Drug Administration – Wikipédia, a enciclopédia livre, ([s.d.]).

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