Alguns estudos mostram que o comportamento igualitário e o ativismo social têm bases científicas. Um artigo recente da Nature Neural evidence for inequality-averse social preferences (doi: 10.1038/nature08785) mostra que o cérebro humano rejeita as preferências sociais anti-desigualdade. No ano passado um artigo do Political Psychology indicava que o ativismo social leva ao bem estar psicológico (Some Benefits of Being an Activist: Measuring Activism and Its Role in Psychological Well-Being (doi: 10.1111/j.1467-9221.2009.00724.x). Vamos ver um pouco o que se fez nestes estudos.
O estudo da Nature foi motivado pelo conhecimento que a espécie humana tem preferencias sociais para reduzir as desigualdades, já evidenciado em estudos comportamentais e antropológicos, mas faltava evidenciar um base neurológica para este comportamento. Os autores estudaram 20 pares de homens que no início do estudo receberam um valor de $30. Um membro de cada par foi selecionado ao acaso para receber um bônus de $50, criando uma desigualdade entre eles. O grau de satisfação dos indivíduos era quantificada numa escala. Adicionalmente, todos os indivíduos foram submetidos a uma ressonância magnética e durante este exame lhes era oferecidas várias diferentes valores em dinheiro e eles tinham oportunidade de ver as ofertas feitas ao outro membro do par. Tanto o membro com menos dinheiro de início (“low-pay”) quanto o com mais recursos (“high-pay”) apresentavam satisfação quando recebiam mais dinheiro e o “low-pay” em escala maior. O que não chega a ser surpreendente. O interessante é que o grupo de “low-pay” não gostava que a diferença entre eles aumentasse, pois eles reagiam negativamente a que o “high-pay” recebesse mais dinheiro, ainda que isto não tivesse um efeito direto sobre quanto eles recebiam. De forma complementar, o grupo “high-pay” reagia negativamente a que a diferença entre os dois fosse reduzida.
Quando os indivíduos recebiam mais dinheiro ocorria uma atividade em áreas cerebrais definidas que se correlacionava com o tamanho do ganho. Quando se tratava do ganho para o outro indivíduo estas áreas respondiam a um comportamento igualitário. A atividade dos “high-pay” aumentava quando o colega “low-pay” recebia mais dinheiro e isto era até maior do que quando eles recebiam para si próprios, o que indicava que a atividade cerebral dos “high-pay” é mais igualitária que a sua sensação subjetiva de satisfação. No caso dos “low-pay” a atividade cerebral ocorria quando eles recebiam dinheiro mas não quando o “high-pay” recebia ainda mais.
Assim, o estudo parece indicar que as estruturas biológicas do cérebro humano responsáveis pela recompensa são mais fortemente igualitárias que o comportamento expresso no nível de comportamento.
O outro texto, publicado no Political Psychology, radicalmente diferente em abordagem, mostra que o ativismo leva a maior bem estar. Os autores revisam estudos que mostram duas online surveys, um deles com 341 estudantes de graduação e uma amostra de ativistas e um grupo controle com 718 indivíduos demostraram que vários indicadores de ativismo se correlacionaram positivamente com medidas de bem estar social, hedônico (sensação de prazer) e eudamônico (sensação de crescimento ou florescimento pessoal). Relatam, ainda, um terceiro estudo com estudantes de graduação que explorou uma possível relação causal entre o ativismo e bem estar. As avaliações de bem estar foram feitas após o engajamento breve em comportamento de ativismo, não-ativista ou nenhum comportamento. Os três grupos tiveram avaliação de bem estar semelhante, mas aqueles que se engajaram brevemente em comportamento ativista relataram maiores níveis subjetivos de vitalidade.
Claro que estes estudos não provam que há um condicionamento biológico em relação ao igualitarismo, mas abalam a crença que o homem tem, por natureza biológica, inclinação à desigualdade e acúmulo em detrimento dos outros.
Claro que estes estudos não provam que há um condicionamento biológico em relação ao igualitarismo, mas abalam a crença que o homem tem, por natureza biológica, inclinação à desigualdade e acúmulo em detrimento dos outros.
Klar, M., & Kasser, T. (2009). Some Benefits of Being an Activist: Measuring Activism and Its Role in Psychological Well-Being Political Psychology, 30 (5), 755-777 DOI: 10.1111/j.1467-9221.2009.00724.x
Lembrei de outro exemplo, em que se demonstrou que o comportamento altruista é selecionado positivamente (acho que também foi tema de post anterior). Não lembro qual artigo havia sido discutido, mas segue um link pra um "velhinho", mas interessante, nessa linha (doi:10.1038/nature02043), e outro com um estudo em crianças, consideradas mais "naturalmente" egoístas por terem menos condicionamentos sociais (doi:10.1016/j.evolhumbehav.2006.10.003). Aparentemente o maior "absurdo" biológico do altruísmo humano é o fato de que ele se dá envolvendo indivíduos com herança biológica diferente (ao contrário do mais descrito em animais, onde o comportamento altruísta de membros de um grupo pode conferir maior chance de sobrevivência para os demais indivíduos com mesmo background genético). Mas "aberrações" equivalentes também podem ser vistas entre animais (por exemplo, casos de "adoção" de filhotes de outras espécies, como gorilas que adotam gatos). É um assunto fascinante... :-)
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